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31/07/03 - BOLICHE NO PAN 2003

extraído da

31/07/2003 - 00h45

Esportes nanicos tentam chamar a atenção de brasileiros no Pan
da Folha de S.Paulo, em Santo Domingo

"Ah, mas isso não é esporte." Eles já estão habituados a ouvir essa frase. Agora, às vésperas de abrir a participação brasileira no 14º Pan-Americano, os praticantes de modalidades pouco (ou nada) conhecidas no Brasil querem aproveitar os holofotes para provar que merecem respeito.

Tratam-se de competidores de esportes como boliche, luta e esgrima -- cujas competições têm início neste sábado --, entre outros, que obtêm alguma visibilidade apenas durante o período de Olimpíada e Pan. Ou, pior, somente durante esse último.

Eles adotaram o evento em Santo Domingo como palanque para reivindicar verbas e projetar imagem de profissionalismo.

Modalidades olímpicas buscam impressionar o Comitê Olímpico Brasileiro, cujo presidente, Carlos Arthur Nuzman, afirmou neste ano que o dinheiro da Lei Piva deve ser distribuído de acordo com os resultados de cada esporte.

Já as categorias não-olímpicas vivem situação mais dramática: não têm direito à verba das loterias e dependem da boa vontade do Ministério do Esporte, que teve o seu orçamento contingenciado no início do ano e libera recursos à base do conta-gotas.

O boliche é o caso mais emblemático do que acontece no Brasil com os não-olímpicos. A modalidade busca superar a idéia de que não passa de mera diversão.

Atletas convivem com citações do tipo "qualquer um joga boliche, é só arremessar a bola e derrubar aquelas garrafinhas. Até eu poderia estar na seleção".

Curiosamente, Walter Costa, 50, um dos integrantes da seleção que disputa o Pan e que representou o Brasil na Olimpíada de Seul-88 (o boliche foi modalidade de exibição) concorda com parte dessas afirmações ao reconhecer que o boliche recreativo é a porta de entrada para o leigo se federar.

"Como diversão, é muito fácil jogar boliche. Mas participar de competições é totalmente diferente. Me traz quem disse que poderia jogar em nosso lugar no Pan que eu mostro", afirma Costa.

"Olha só. Algum leigo entenderia isso aqui?", questiona outro atleta, Fábio Rezende, 26, ao exibir um gráfico que mostra o grau de oleosidade na pista. De acordo com esse fator, cada jogador pode escolher entre até seis bolas. "Funciona como a escolha dos pneus na F-1", compara, ao informar que outros detalhes de física e aerodinâmica também influem.

Mas como fazer para que a participação do boliche brasileiro em torneios internacionais deixe de ser recebido com ironias? "Todos se acham entendidos em boliche. Mas trabalhamos na formação de técnicos para os leigos perceberem que o boliche vai além de uma brincadeira", diz Hermindo Troncoso Gonçalvez, 57, um dos treinadores da seleção.

O que chama mais atenção é o fato desses esportes sem tanta tradição no Brasil distribuírem um número grande de medalhas. O torneio de luta, por exemplo, pode render até 18 pódios. "Queremos levar medalha e chamar a atenção para que o COB invista mais na gente", disse o presidente da confederação brasileira da modalidade, Pedro Gama Filho.

Na esgrima, que recebe R$ 1,5 milhão de Lei Piva, são dez insígnias em jogo. Como todos os seus pares, Alexandre Teixeira, um dos técnicos da seleção, aguarda apreensivo o início das disputas.

"Esse momento é fundamental para nós. No Pan, temos a chance de aparecer, atrair patrocinadores e dinheiro. Daqui a alguns dias, seremos esquecidos", diz.

Atletas de esportes pouco conhecidos vivem no amadorismo

Esporte não é profissão, não rende dinheiro e não garante um futuro de regalias. É com essa perspectiva amadora que os atletas de esportes pouco conhecidos no Brasil tocam suas vidas.

Entre os 16 representantes do país na esgrima, por exemplo, quem não trabalha já está a caminho de achar uma profissão. Existem arquitetos, professores de educação física e administradores. Os mais jovens vão prestar vestibular. E, se a carga horária da faculdade for muito exaustiva, o esporte ficará em segundo plano.

No boliche, a participação de Walter Costa na Olimpíada de 1988 teve um sabor agridoce. Se obteve uma colocação razoável --um sexto lugar entre 12 participantes--, perdeu o emprego por ter de se ausentar do país.

Já para a caçula da equipe de boliche, Luiza Rocha, 17, a modalidade abre portas para uma formação acadêmica. Ela negocia bolsa em uma faculdade dos EUA justamente por causa do esporte.

Ao ser questionada sobre o que terá prioridade na hora de definir o futuro, não esconde: "A carreira profissional é mais importante do que a esportiva".

Esportes nanicos pouco ajudam na luta por medalha
da Folha de S.Paulo

Apesar de pouco difundidas, algumas modalidades que não despertam muito interesse no Brasil são verdadeiros mananciais de medalhas.

Mas uma rápida revisão na história do Pan-Americano mostra que o país pouco fez para se aproveitar desse fato.

Dos esportes que não integram o projeto olímpico, o mais premiado do Brasil é o caratê. Foram 13 pódios em Pans. Em Winnipeg, há quatro anos, o país levou oito insígnias.

Outro esporte desconhecido que não vai à Olimpíada e já conseguiu alguma premiação é o squash. Os praticantes conquistaram sete medalhas no principal torneio das Américas --duas delas na última edição.

No grupo das categorias olímpicas pouco praticadas que recebem recursos da Lei Piva, a mais laureada é a esgrima. Integrante do programa do Pan desde a primeira edição, em 1951, também rendeu sete minguadas insígnias --a última delas em 1975.

"Neste ano, temos condições de lutar por um bronze. Mas é difícil prever e prometer alguma coisa. Só posso afirmar que, se a equipe continuar crescendo, vamos quebrar esse tabu em 2007", afirmou Eduardo Romão, um dos coordenadores técnicos da esgrima brasileira em Santo Domingo.

A luta vive situação semelhante. Em Indianápolis-1987, Roberto Leitão ganhou um bronze na categoria até 90 kg. De lá para cá, nenhum outro atleta chegou a um posto entre os três primeiros em Pans.

Boliche (que não faz parte do programa olímpico), badminton e beisebol (ambas olímpicas) nunca angariaram medalhas para o país.

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